Em julgamento ocorrido em 27/9/2022, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou um acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) que denegou a segurança a um contribuinte que buscava o reconhecimento da não incidência do imposto sobre ganho de capital dele cobrado pela Receita Federal em virtude de uma operação de cessão de precatório mediante aplicação de deságio sobre o total do crédito.
O voto proferido no âmbito do REsp n. 1.785.762/RJ fez referência à consolidada jurisprudência da Corte Superior no sentido de que não incide imposto sobre a renda resultante da cessão onerosa de créditos decorrentes de precatórios com deságio, tendo feito menção a julgados dos anos de 2018 (AgInt no REsp n. 1.768.681/RJ), 2019 (REsp n. 1.704.367/RJ), 2020 (REsp n. 1.859.259/RJ) e 2021 (AgInt no REsp n. 1.792.613/RJ; AgInt no REsp n. 1.824.282/RJ) e registrado que “o acórdão recorrido não se encontra alinhado à jurisprudência desta Corte”.
O caso merece destaque porque a Receita Federal do Brasil (RFB) tem ignorado a posição da Corte Superior e realizado esse tipo de cobrança indevida em face dos contribuintes.
No site[1] da RFB, mais especificamente no documento denominado “Perguntas e Respostas 2022”, a instituição detalha o entendimento que aplica em contrariedade ao que dispõem a Lei e a jurisprudência (Respostas às perguntas 246 e 571; Solução de Consulta Cosit nº 674, de 27 de dezembro de 2017; e Solução de Consulta SRRF06/Disit nº 6.007, de 25 de março de 2019).
O paradigmático voto proferido pelo Ministro Mauro Campbell Marques no âmbito do REsp n. 1.505.010/DF em 27/10/2015 facilita a compreensão da ilegalidade que a RFB insiste em cometer quando ensina que a disponibilidade econômica e jurídica do crédito (decorrente do trânsito em julgado da sentença) não pode ser confundida com a disponibilidade financeira (decorrente do efetivo pagamento do precatório).
A consequência prática dessa distinção é a compreensão de que, no momento da alienação, já existia um crédito disponível na esfera patrimonial do titular do precatório e que, portanto, em havendo deságio, não há acréscimo patrimonial algum para o cedente, pelo contrário, há um decréscimo aceito em virtude do ganho de liquidez, isto é, do imediato recebimento da quantia a ser paga pelo cessionário (antecipação da disponibilidade financeira).
Não há, assim, caminho lógico ou jurídico que autorize a incidência de imposto sobre ganho de capital no contexto de uma operação que, para o titular do precatório, significa perda de capital, mesmo que com ganho de liquidez.
A recomendação para os titulares de precatórios que, porventura, venham a ceder seu crédito com algum deságio a terceiros é a de que fiquem atentos ao tratamento tributário conferido à operação pela RFB e certos de que, nos termos de jurisprudência do STJ, não incidem quaisquer ônus tributários adicionais sobre esse tipo de operação.
Para aqueles que desejem adquirir esse tipo de crédito, o tratamento tributário pode variar de caso a caso e a recomendação é simples: uma análise jurídica prévia e cuidadosa no momento da precificação, isto é, antes de que seja endereçada a proposta de compra e, evidentemente, de que seja realizada a operação.
[1] Disponível em: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/perguntas-e-respostas/dirpf/pr-irpf-2022.pdf/view; Acesso em 29/07/2022